1) Introdução:
Na sequência da abordagem proposta vamos agora tratar do enquadramento tributário dos contribuintes do Simples Nacional (SN).
Nesse contexto, (1) quando uma pessoa física (pessoa natural) decide executar um negócio por sua conta e risco, mas não pode aderir à sistemática do MEI (por conta: da atividade que desenvolve, do tamanho de seu faturamento ou da sua quantidade de funcionários), ou (2) quando o empresário aderente ao MEI não pode mais nele permanecer, geralmente, resta-lhe viável o enquadramento no regime tributário ordinário do Simples Nacional (SN), salvo quando houver a obrigatoriedade de utilização de outro regime de apuração (Lucro Presumido ou Lucro Real).
Sem dúvidas o mais conhecido dos regimes de apuração tributária, o Simples Nacional (SN) permite às microempresas (ME) e às empresas de pequeno porte (EPP) apurarem seus tributos de maneira mais simplificada do que os regimes do Lucro Presumido e do Lucro Real, aplicando-lhes, em regra, apenas uma única alíquota sobre o faturamento bruto da empresa para a apuração de todos os tributos.
Saliente-se que ter a forma de cálculo dos tributos mais simples não significa que ela é necessariamente a mais barata, pois, contraintuitivamente, há diversos enquadramentos e formatações dentro do Simples Nacional que são tributariamente mais caros do que seus correlatos possíveis dentro de algum dos outros dois regimes citados. Desse modo que a simplicidade do Simples Nacional está, sem dúvidas, na sua compreensão ampla, mas não, necessariamente, no seu custo para aqueles que lhe aderem.
Nessa linha, o critério para a determinação do que sejam microempresa (ME) e empresa de pequeno porte (EPP) para a sistemática tributária do Simples Nacional é o faturamento médio da empresa em um período de 12 meses anteriores a tal medida, sendo, atualmente, ME aquela empresa que fature R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) em tal período e EPP aquela empresa que nesse mesmo lapso temporal fature acima disso e abaixo do limite máximo de receita bruta anual para ingresso ou permanência no sistema do Simples Nacional (limite esse que é, hoje, de R$ 4.800.00,00).
Grife-se, também, que para efeito de adesão ou manutenção no Simples Nacional a consideração do que sejam as microempresas (ME) e as empresas de pequeno porte (EPP), atualmente, leva também em conta o aspecto societário do pretendente ao regime simplificado (além do faturamento bruto anual), considerando como aptas para tal adesão: as sociedades empresárias, as sociedades simples, as empresas individuais de responsabilidade limitada (EIRELI) e os empresários individuais referidos no art. 966, do Código Civil (considerado com suas exclusões e limitações). Assim, estarão fora de tal possibilidade simplificada as empresas com outros formatos societários.
2) Enquadramento, não enquadramento, exclusão e consequências;
Nesse contexto, o enquadramento no sistema tributário do Simples Nacional tem (1) no faturamento das empresas seu primeiro e principal critério de adesão e permanência, sendo, atualmente autorizado para pessoas jurídicas que tenham receita bruta anual de até R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais), devendo a solicitação de sua opção ser feita: (i) até o último dia útil de janeiro do ano calendário em que tal adesão produzirá efeitos para empresas que já estejam em atividade, ou (ii) em até trinta dias a partir do deferimento da inscrição municipal ou estadual para empresas que iniciarem suas atividades durante o transcurso do ano.
Porém, além do limite máximo para (1) a receita bruta anual, existem outros limitadores para o ingresso ou permanência de dado contribuinte no Simples Nacional, quais sejam:
(2) ter participação em seu capital de outra pessoa jurídica;
(3) ser filial, sucursal, agência ou representação, no País, de pessoa jurídica com sede no exterior;
(4) ter participação em seu capital social de pessoa física que seja inscrita como empresário ou seja sócia de outra empresa que também receba tratamento jurídico diferenciado do Simples Nacional, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais);
(5) ter titular ou sócio que participe com mais de 10% (dez por cento) do capital de outra empresa não beneficiada pelo Simples Nacional, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais);
(6) ter sócio ou titular que seja administrador ou equiparado de outra pessoa jurídica com fins lucrativos, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais);
(7) ser pessoa jurídica constituída sob a forma de cooperativas, salvo as de consumo;
(8) ser participante do capital social de outra pessoa jurídica;
(9) que exerça atividade de banco comercial, de investimentos e de desenvolvimento, de caixa econômica, de sociedade de crédito, financiamento e investimento ou de crédito imobiliário, de corretora ou de distribuidora de títulos, valores mobiliários e câmbio, de empresa de arrendamento mercantil, de seguros privados e de capitalização ou de previdência complementar;
(10) ser pessoa jurídica resultante ou remanescente de cisão ou qualquer outra forma de desmembramento de pessoa jurídica que tenha ocorrido em um dos 5 (cinco) anos-calendário anteriores;
(11) ser constituída sob a forma de sociedade por ações; e
(12) ser pessoa jurídica cujos titulares ou sócios guardem, cumulativamente, com o contratante do serviço, relação de pessoalidade, subordinação e habitualidade.
Além das limitações de enquadramento no Simples Nacional (art. 17), deve-se pontuar, também, que existem, em paralelo, as hipóteses de exclusão de tal sistema, elencadas em toda Lei Complementar n.º 123/2006, sobretudo, em seu art. 29, configurando-se em situações em que o contribuinte, mesmo depois de enquadrado em tal regime de tributação, será dele excluído.
Nessa linha, caso um contribuinte esteja enquadrado em algumas das hipóteses proibitivas para o Simples Nacional não poderá nele ingressar e se já estiver nele enquadrado e tal circunstância proibitiva acontecer, supervenientemente, será dele excluído (situação em que será tributado na sistemática do lucro presumido ou do lucro real, conforme indicar).
No que se refere às exclusões, o sistema do Simples Nacional cria várias combinações entre as hipóteses que as originam (por opção própria e obrigatórias) e os diferentes momentos em que seus efeitos começam a ser produzidos (a partir do próprio mês em que aconteceram, a partir do mês seguinte ao seu acontecimento e partir do ano calendário posterior à sua ocorrência), sendo o motivo da retirada do contribuinte do sistema do Simples Nacional o critério determinador dessas combinações.
3) Tributos pagos e apuração:
Dentro da sistemática do Simples Nacional, em regra, os tributos ordinariamente devidos pelas empresas (IPI, PIS/Pasep, COFINS, IRPJ, CSLL, ICMS ordinário, ISS, CPP/INSS) são apurados e pagos de uma só vez.
Isso porque a estrutura de tributação de uma empresa no Simples Nacional é determinada, basicamente, por dois critérios: (1) a atividade desenvolvida e (2) o faturamento médio dos últimos 12 meses, de modo que:
(1) com base no primeiro critério, o contribuinte saberá em qual sequência de alíquotas possíveis estará enquadrado, em qual tabela anexa à Lei Complementar n.º 123/2006 está elencada sua atividade;
(2) com base no segundo critério, ele determinará, dentre as alíquotas possíveis da tabela anexa na qual esteja enquadrado, qual é a alíquota que será efetivamente aplicada ao seu faturamento em dado mês.
Grife-se que essa alíquota de incidência do Simples Nacional pode ser considerada como uma alíquota ampla, pois nela estão contidas alíquotas menores, correspondentes cada qual a um dos tributos incluídos na sistemática do Simples Nacional (IPI, PIS/Pasep, COFINS, IRPJ, CSLL, ICMS ordinário, ISS, CPP/INSS).
Saliente-se, porém, que há tributos cuja apuração e pagamento não estão incluídos dentro da alíquota ampla do Simples Nacional, nos exatos termos em que a Lei Complementar n.º 123/2006 determina (ICMS de diferencial de alíquota – DIFAL, IOF, II, IE, ITR, IR com tributação específica etc.), restando fora desse regime tributário e, por isso, sendo apurados e pagos em separado daqueles outros nele incluídos.
Nesse contexto, de acordo com a atividade que o contribuinte desenvolva será ele enquadrado em uma sequência de alíquotas possíveis para ser tributado (as conhecidas cinco tabelas de atividades anexas do Simples Nacional) que variam de acordo com a sua receita bruta média no período de 12 meses, aumentando ou diminuindo de acordo com a variação dessa mediana.
Importante frisar que para os contribuintes passíveis de serem enquadrados na tabela anexa V a determinação do enquadramento nas tabelas de atividade do Simples Nacional apresenta uma variante que merece destaque por extrapolar o critério básico de atividade x faturamento bruto médio, qual seja: a relação proporcional entre a folha de pagamentos média dos últimos 12 meses e o faturamento bruto médio dos últimos 12 meses do contribuinte (função essa denominada de fator R). E, com base nessa razão, poderá o contribuinte ser enquadrado na tabela anexa III (se ela for acima de 28%) ou na tabela anexa V (se ela for até 28%).
Outro ponto que, também, afigura-se fundamental ressalvar é a existência de uma grande quantidade de variantes de apuração próprias do regime de tributação do Simples Nacional que estão fora da regra geral simplificada alíquota x receita bruta média, exigindo uma classificação pela origem das receitas brutas e posterior tributação.
Cada uma dessas situações possui peculiaridades na apuração dos tributos devidos, sendo elencadas nos artigos 18 a 20 da Lei Complementar n.º 123/2006 (revenda de mercadoria, venda de mercadoria industrializada fora da atividade principal do contribuinte, locação de bens imóveis e móveis, comercialização de medicamentos manipulados, bens destinados à exportação etc.) ou provenientes de outras legislações aplicáveis às empresas enquadradas na sistemática do Simples Nacional (como o ICMS de diferencial de alíquota – DIFAL).
Nessa linha, dentre todas essas possibilidades existentes, pode-se destacar quatro, em função do índice de sua ocorrência e do impacto tributário que geram no rendimento tributário dos contribuintes:
(1) a segregação de receitas decorrentes de venda de produtos sujeitos à tributação concentrada (ICMS substituição tributária e PIS e COFINS monofásicos) para que esses tributos já recolhidos em momento anterior da cadeia de distribuição não sejam cobrados novamente pela incidência integral da alíquota ampla própria do contribuinte enquadrado no Simples Nacional, sendo permitido que as receitas decorrentes da venda de tais produtos sejam tributadas em separado e sem as alíquotas menores pertinentes àquelas da tributação concentrada;
(2) a apuração de ICMS e ISS em separado da sistemática simplificada (e nos termos determinados pelo respectivo ente federativo) para empresas que faturem acima dos sublimites de receita bruta anual de: (ii.1) R$ 1.800.000,00 em Estados, em Municípios e no Distrito Federal quando sua participação no PIB nacional seja de até 1%, e (ii.2) R$ 3.600.000,00 em Estados, em Municípios e no Distrito Federal quando sua participação no PIB nacional seja acima de 1% ou quando algum deles não tenha adotado o sublimite expressamente;
(3) a apuração em separado de contribuição previdenciária patronal (CPP) das empresas que exerçam atividade de (iii.1) construção de imóveis, (iii.2) serviço de vigilância, limpeza ou conservação e (iii.3) serviço de advocacia, situações essas em que tal contribuição incidirá sobre a folha de salários do contribuinte nos mesmos percentuais e base de cálculo em que incide nos regimes do lucro presumido e lucro real; e
(4) a apuração em separado do ICMS de diferencial de alíquota – DIFAL (entre a alíquota interestadual e a interna do alíquota estado de destino da mercadoria) para operações interestaduais em que empresas do Simples Nacional vendem ou compram bens, situações em que a empresa mesmo estando no regime simplificado pagará o ICMS – DIFAL em separado da sua apuração normal (sendo tal ICMS – DIFAL pago pela empresa remetente quando a mercadoria for destinada a não contribuinte de ICMS e será pago pela empresa destinatária quando for ela contribuinte de ICMS).
4) Conclusão:
Diante do exposto, pode-se constatar que o sistema do Simples Nacional é um regime tributário que, não obstante a sugestividade de seu nome, não é tão simples e vantajoso para os contribuintes por alguns motivos.
O primeiro é que o Simples Nacional não é acessível para todas as empresas e realidades societárias, havendo uma série de restrições para seu ingresso e permanecia.
A segunda razão é que o Simples Nacional é apenas aparentemente menos complexo do que os outros regimes que lhe são alternativos (Lucro Presumido e Lucro Real), pois, os critérios do seu formato de apuração faturamento médio anual x alíquota sofrem exceções de acontecimento recorrente que, por isso, tornam sua exata compreensão e correto manejo (e apuração) mais difícil do que, inicialmente, projeta-se.
E, em terceiro lugar, o Simples Nacional é também apenas aparentemente menos oneroso do que os outros regimes tributários que lhe são correlatos possíveis (Lucro Presumido e Lucro Real), uma vez que as variantes no formato de apuração faturamento médio anual x alíquota ensejam uma diminuição considerável do rendimento tributário das empresas em função da dificuldade dos operadores tributários na sua correta utilização. De modo que, em boa parte de casos, o Simples Nacional se torna mais oneroso tributariamente do que os outros regimes.
Dessa forma, o Simples Nacional pode apresentar vantagens e desvantagens para os contribuintes, sendo equivocado entende-lo como o melhor regime tributário para as empresas apenas pela (inocente) pressuposição de que é um regime tributário em que o Estado exige menos de seus destinatários.